INELEGÍVEL? SÓ POR SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO (art. 15 Const.)
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Na República e nas democracias o direito fundamental das pessoas é o de sufrágio universal, o de votar e ser votado, o direito de participação política. Até porque todos os demais direitos e a própria organização da vida social dependem do exercício desse direito.
Sem o que, as pessoa serão consideradas coisas, objetos e não sujeitos, não serão cidadãos. Sujeito na democracia e na República é quem pode votar e ser votado. Nossa Constituição traduz esse direito de maneira singular, em patamar elevado: é a forma do exercício da soberania popular (art.14).
Está dito lá: a soberania popular existirá através do sufrágio universal, voto direto, secreto, igual. O sufrágio é o voto do cidadão, a manifestação mais elevada das pessoas, direito subjetivo positivo, portanto.
E o direito de ser votado, direito subjetivo, de todas as pessoas, negativo, que se liga diretamente ao direito positivo do exercício do voto que escolhe as pessoas no Executivo e no Legislativo.
E é parte nuclear do capítulo dos direitos políticos, integrante das garantias fundamentais, que nenhuma lei, nem mesmo emenda à Constituição, pode alterar. Nem o Judiciário pode negar. É o fundamento da organização política e da vida social.
O exercício do direito de sufrágio universal, votar e ser votado, assegurado como direito fundamental pelo 14, fará o povo soberano, com ele se concretizará a soberania popular. De um lado, define quem pode votar, quem pode escolher, ser eleitor. De outro, quem pode ser escolhido, ser votado: ser brasileiro, estar no pleno exercício dos direitos políticos, ser eleitor, domicílio eleitoral, ser maior de idade e alfabetizado.
O exercício dos direitos políticos é a alma da democracia e da República. A Constituição cuidou que ninguém, nenhuma instituição, nem presidente, nem judiciário, nenhum juiz ou o Supremo poderá cassá-lo. (Art.15) Embora não possam ser cassados, os direitos políticos podem ser suspensos, isto é, ter o seu exercício vetado temporariamente.
A hipótese mais relevante é a de que os direitos políticos podem ser suspensos por CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO (III). A Constituição não deixou por menos: mesmo no caso de uma pessoa condenada, esta somente terá os direitos políticos suspensos temporariamente, isto é, não poderá ser votada, se todos os recursos foram feitos e julgados, somente se não houver mais apelação. Isto para evitar as injunções políticas nas condenações imediatas, especialmente se produzidas por adversários ou induzidas pela mídia.
E para ficar coerente com o que determina o inciso LVII do art.5º.: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Ser considerado inelegível, ficar despido dos direitos políticos é lesão tão grave aos direitos do cidadão que a Constituição resolveu ela própria fixar as regras.
O Ministro Roberto Barroso procurou justificar a posição do Supremo em considerar constitucional a Lei da Ficha Limpa, na lamentável decisão do TSE sem base jurídica nenhuma, que interfere no processo eleitoral em favor de certos candidatos ao impedir Lula de concorrer, pelo fato de estar previsto no § 9º. do art.14 a hipótese de existir lei que adote outros casos de inelegibilidade.
Podem existir leis com outros casos, mas jamais que venha afrontar o que diz o art. 15.: alguém não pode ser votado somente com sentença transitada em julgado. A Constituição não deixou margem para o legislativo, nem tampouco para o Judiciário, mexer nesta questão. O Judiciário, por não ter voto, não é poder eleito, não é banhado pelo voto, não pode interferir no processo político, não pode alterar os direito políticos. Nem o Legislativo pode ir além do que prevê a Constituição.
Aliás o Ministro Barroso deixou escapar sua natureza política ao afirmar que o que o movia era o bem do Brasil. Ora, o que deve mover um juiz é aplicar corretamente a Constituição e as leis, zelar pela preservação da ordem jurídica. O bem do Brasil é decidido nos embates políticos: uns acham que é por um caminho, outros acham que é por outro e o povo decide no voto.
O próprio Ministro Barroso já manifestou preferência por um dos caminhos, pela simpatia e afinidade que sempre devotou aos tucanos, como é comentado nos meios jurídicos no Rio, na UERJ, onde deu aulas, e nos votos que deu a Fernando Henrique Cardoso, a quem pleiteou ser nomeado Ministro do Supremo nos últimos momentos do seu governo. O Supremo está nitidamente querendo escrever uma nova Constituição e reescrever as leis existentes como se tivesse investidura para tanto. Até quando e onde irá?